Zheng Shi, T. 1: La Rivière des Perles
Estava aqui a pensar sobre se costumo começar muitas vezes estes comentários pela referência ao autor. Não muitas, creio. Mas neste caso tenho de começar pelo nome de Jean-Yves Delitte, autor de muitos e muitos tomos de Banda Desenhada, pintor oficial da marinha belga, referência em páginas e páginas de navios, mar e combates navais. Em Portugal, a Gradiva já publicou “As Grandes Batalhas Navais”, a Asa “Black Crow” e “U-Boot”. A sua qualidade de desenho realista, detalhado, exigente nas cenas marítimas constitui a base do seu sucesso.
Curiosamente, lembro-me bem da primeira BD que li desenhado por Jean Yves Delitte, publicada há mais de 25 anos, chamada “Mort d’un Ministre” (série “Les Coulisses du Pouvoir”), em que a narrativa era toda passada em terra! Uma bela série, é verdade, mas não é para falar dela que “aqui estou”, mas sim para falar da recém-publicada BD sobre a mulher pirata de uma parte do Mar da China, de nome Zheng Shi, e cuja face se encontra na capa deste tomo 1 das suas aventuras.
Prevista para dois tomos, esta narrativa que se pretende (razoavelmente) real, relata as aventuras de uma mulher que terá comandado mais de 40 mil piratas e frotas de pequenos navios que aterrorizaram o Rio das Pérolas, com mais de 2200 km, e o seu delta com o mesmo nome nos inícios do século XIX, e que terá oferecido “proteção” a diversos armadores e comerciantes, transformando a sua atividade num negócio rentável.
Quanto ao desenho, ele é característico, as faces são semelhantes, as cenas de ação são elegantes, os navios são notáveis. O autor gosta, claramente, das cenas marítimas, e elas são o centro das atenções, às vezes obrigando a uma concisão na restante narrativa que por vezes é muito notória. Mais páginas do que as 46 desta BD seriam um bom contributo para a fluidez narrativa. Uma mulher pirata permitiria uma profundidade interessante na abordagem às personagens. Falta um outro tomo, é verdade, vamos ver como evolui, e provavelmente a leitura das 92 páginas eliminará esta vontade de saber mais, de avançar e conhecer desenlaces. Para os apreciadores de ação, pirataria e combates navais, não poderia haver melhor, desenho e cor são fascinantes, as cenas em página dupla são excelentes!
Editado, como habitualmente, pela Glénat, neste caso nos inícios deste ano.
La Trilogie Berlinoise, T.2: La Pâle Figure
Uma trilogia é, consta, constituída por três volumes, neste caso, de BD. Esta é a segunda BD da trilogia que tenho oportunidade de ler, adquirida acabadinha de chegar às livrarias. A primeira tinha como título L’été de Cristal, o que para uma trilogia “Berlinense” nos remete para a ascensão do nazismo nos anos 30, fora publicada nos idos de 2021: 4 anos de espera para o tomo 2.
No primeiro tomo da adaptação do romance de Philip Kerr, o tom é estabelecido: Desenho “na linha” da linha clara, muito elegante e atraente, cuidado e detalhado, ambientes de policial “à Orson Welles”, boa descrição da vida Berlinense nos anos 30, um detetive, antigo polícia, Bernie Gunther, incorruptível, duro, independente, com um forte sentido de humor que consegue não ser do agrado de ninguém, desenrascado, inteligente mas por vezes ingénuo neste contexto de nazificação para o qual não se encontra adaptado. Base de Narração em voz off!
No segundo tomo, aquele aqui em destaque, reencontramos Gunther, juntamente com um sócio que foi buscar à polícia, a começar um inquérito sobre uma chantagem levada a cabo sobre o filho de uma rica editora. Motivo: as aventuras homossexuais daquele, sabendo-se que o atual regime não vê a homossexualidade com bons olhos.
No entanto, essa investigação é um mero ponto de partida para uma aventura em que o nosso detetive é “forçado” por um alto dignitário nazi, a reintegrar temporariamente a polícia para levar a cabo uma investigação sobre o rapto e assassínio de jovens alemãs de “pura raça ariana”. Curiosamente os dois casos vão apresentar alguns elementos comuns.
Tendo de se mover com cuidado entre os diversos poderes nascentes do regime nazi, o nosso detetive conduz com profissionalismo e pouca ajuda, a sua investigação, até deslindar o caso. Só que este é muito mais complexo e intrincado do que inicialmente previsto. Fanatismo, incompetência, a luta pela proximidade ao chefe, o abuso de poder, a questão judaica, são temas centrais desta BD.
Uma investigação interessante, inteligentemente apresentada, e que nos suscita permanente curiosidade. O/a leitor/a distingue bem as personagens, os raciocínios de Gunther são compreensíveis, se bem que nem sempre previsíveis, e à medida que vamos avançando nas páginas, começamos a ter uma ideia de “onde vamos parar”. O equilíbrio entre narração e diálogo é muito agradável e ajuda a seguir a linha de inquérito, bem como a ganhar simpatia pela personagem central. O desenho estilo “retro” é muito bom, adequado ao ambiente a relatar, com os tons cinzentos e beges a dominarem.
Uma bela BD, com uma edição de qualidade e uma excelente capa. Pierre Boisserie assegurou a adaptação do romance, François Warzala assegurou o desenho. Editado por “Les Arènes”.
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