Habemus Bastard – Tomo 2
Há um pouco menos de um ano, pude dar aqui a minha opinião sobre Habemus Bastard Tomo 1 de Schwartzmann e Vallée, e nessa altura escrevi: “Veremos se o desenlace permitirá manter o excelente nível desta primeira parte…”. Não manteve, ultrapassou, na minha opinião o segundo tomo é ainda mais interessante e bem estruturado que o primeiro, talvez porque permite dar resposta a várias questões que ficavam em suspenso na primeira “entrega”.
Continuamos a acompanhar Lucien, homem de mão de um chefe de grupo criminoso, que se esconde por trás de uma batina/sotaina, depois de ter cometido um pequeno erro numa tarefa que lhe tinha sido encomendada pelo chefe.
Padre em Saint-Claude, Lucien começou, no tomo um a sua adaptação às suas tarefas e à sua nova vida, incluindo o desenvolvimento das suas relações com a comunidade local, com destaque para a mãe de um dos seus alunos de catequese, com a mulher que faz as limpezas na sua casa de função e lhe dá apoio diário, bem como com o seu filho – canal de acesso ao mercado de droga local, com o empreiteiro da região, responsável por algumas construções na vila e na igreja, com o seu invejoso colega de localidade próxima, e a uma pequena jovem que o apoio na missa, inteligente, órfã de mãe e com um pai mais dado ao consumo de bebidas no bar local. A isto vem-se juntar a visita de uma jovem do passado!
Apanhado no meio de uma disputa entre dois gangs, sendo um deles aquele para o qual trabalhou e que o procura, e o outro um gang rival que procura vingar uma morte, tentando eliminar um padre que, por azar, é aquele cuja batina Julien está a usar!
E vamos ter bastante ação, mas sempre com um humor que nos diverte e torna a leitura agradável e difícil de interromper.
Esta história vai num crescendo interessante, bem desenvolvido, com diálogos cortantes e uma narrativa magistralmente elaborada. O desenho de Vallée é excecional, ágil, apelativo, cinematográfico, marcante e reconhecível.
A ler e reler, e voltando a uma referência que fiz no anterior comentário, espero que esta bela edição da Dargaud (Tome 2: Un Coeur sous une Soutane) veja um dia a luz em versão portuguesa.
Un Putain de Salopard, Tome 4: Le Rituel
Vou traduzir para português o título desta série para “Um Filho da Mãe”. Outras traduções, se calhar mais adequadas, não seriam próprias para este texto!!!?
Escrever sobre o tomo 4 e último de “Un Putain de Salopard” constitui uma oportunidade de falar sobre uma excelente série, talvez das melhores que alguma vez li e que tive a oportunidade de apreciar das mais recentes.
A história é passada em território brasileiro, em plena selva da Amazónia, na década de 70, numa zona onde há apenas um agente da lei por muitos km quadrados. No caso, o nosso agente da lei (Régo) é 5 estrelas e dotado de um grande bom senso, se bem que um pouco estrábico…
Max regressa a este território de onde saiu com três anos, acompanhando a sua mãe, recentemente falecida, que nunca quis falar sobre o passado ou sobre as suas origens. Max não conhece o seu pai, e vem iniciar uma busca tendo como única pista duas fotografias de sua mãe com dois homens diferentes. Qual deles será o seu pai? E como encontrar esses homens?
A chegada de Max é simultânea com a de duas jovens enfermeiras, Christelle e Charlotte, que vão tomar conta do dispensário local, durante três meses. Os três vão ao encontro de Corinne (Sim, C-C-C), uma jovem que vive há alguns anos no local e que vai servir de base para os contactos necessários.
Neste território selvagem, a violência que nele grassa vai fazer com que Max acabe perdido na selva, acompanhado de Baia, uma jovem muda, que felizmente conhece a medicina das plantas e sabe desembaraçar-se na selva. Com tudo isto, os jovens vão enredar-se numa velha história de tráfico, de roubo e de rapto da jovem filha de Hermann que dirige com mão de ferro uma exploração mineira local, e que agora vive apenas para encontrar os restos mortais da sua filha, que se sabe morta num acidente de aviação. Nesse avião iam também os dois “candidatos” a pai de Max.
E pelo meio temos um verdadeiro e c*#r!o “filho da mãe” tal como é chamado logo no tomo 1 por Margarida, a proprietária “faz tudo” do bar “O Tucano” onde Corinne trabalha.
Enfim, tenho pouco espaço para descrever uma história rica de detalhes e de personagens, conduzida com mão de mestre por Regis Loisel, sempre convincente, interessante, entusiasmante, credível, com boa caracterização da generalidade dos “atores e atrizes” principais, e com excelentes diálogos. Apenas posso apontar uma ou outra incorreção nas tentativas de acrescentar palavras ou frases em português do Brasil, mas nada que tenha impacto na agradabilidade da leitura.
O grafismo de Olivier Pont é excelente, dinâmico, elegante, consistente ao longo dos 4 tomos, e as pranchas passadas no meio da selva são muito bem conseguidas sem exageros ou artifícios. As cores têm verdadeiro valor acrescentado. Bonito, agradável, excelentes sequências, qualidade narrativa total.
Quatro tomos de nível consistente, uma série IN-DIS-PEN-SÁVEL, de Loisel (Armazém Central, Peter Pan, Em Busca do Pássaro do Tempo) e de Pont (de que me recordo quando em 2004 publicou uma excelente série, “Où le Regard ne Porte Pas…”). Editado pela Rue de Sévres.