domingo, 5 de janeiro de 2025

A opinião de Miguel Cruz sobre "La Quête de L’Oiseau du Temps T.12 - L’Omégon", de Le Tendre, Mallié e Loisel e "Nestor Burma – Du Rififi à Menilmontant - HS.06", de Tardi

 


L’Omégon t.12 – o último Tomo de "La Quête de L’Oiseau du Temps"

O décimo segundo é também o último tomo da excelente e extraordinária saga do cavaleiro Bragon, entre outras personagens memoráveis, como Mara ou Bulrog. 

Não consigo deixar de sorrir cada vez que me recordo que o primeiro tomo foi publicado em 1983…sim, oitenta e três. É verdade que o primeiro ciclo, composto pelos 4 primeiros tomos, foi terminado em 1987, e que o segundo só se iniciou em 1998. Mesmo assim, 26 anos para concluir uma aventura, é obra.

Curiosamente alguns tomos desta “saga” foram publicados em Portugal, mas nunca tivemos o prazer de poder ler na nossa língua a totalidade dos tomos. Essa lacuna talvez venha a ser preenchida agora que os autores deram por terminado o seu trabalho. 

O primeiro ciclo foi-nos apresentado por um duo que dispensa qualquer apresentação: Le Tender no argumento e Loisel no desenho. Fica o registo: tornou-se uma das minhas séries preferidas. A qualidade do primeiro ciclo levou-nos, necessariamente ao segundo ciclo, sendo que importa ser claro, assinalando que a qualidade dos oito tomos que o compõem é desigual, nunca mau, mas, nalguns casos, mediano. E não é por causa do desenho que passou a estar a cargo de Lidwine no tomo 5, Aouamri no tomo 6, Mallié nos tomos 7, 8 e agora 12 e Etien nos tomos 9, 10 e 11. A qualidade do desenho é sempre boa, mesmo para quem acha – é o meu caso – que é difícil fazer tão bom ou melhor que Loisel.

O tomo 12 e último (surge numerado como tomo 8 – o último do segundo ciclo), podemos ficar descansados, é mesmo muito bom, e encerra o ciclo pensado e escrito pelo duo Le Tendre – Loisel, com brio. Gostei mesmo bastante e compensou do desgaste causado pelos longos intervalos entre publicações. 

Editado pela Dargaud, o que posso fazer é recomendar, pela qualidade do desenho, a beleza dos ambientes, pela profundidade de tratamento de temas contemporâneos através de uma “saga fantástica”, pelo excelente tratamento narrativo, pela consistência do universo criado pelos autores, pela relação que conseguimos criar com as personagens. O segundo ciclo, recorde-se, é uma prequela aos quatro primeiros tomos – sim, claro que agora vou reler tudo começando pelo segundo ciclo que antecede o primeiro…

Quanto à história, não é fácil abordá-la aqui pois trata-se de uma sequência de 8 tomos: O crescimento de Bragon como cavaleiro, a evolução da sua vida e o seu desenvolvimento pessoal, a sua relação com Mara, um conjunto de aventureiros marcantes e com papeis relevantes no desenvolvimento da narrativa, magia e oráculos, uma epopeia fantástica, sendo que L’Omégon (título do álbum), é o Tribunal de Justiça Supremo dos Deuses, localizado longe, nas Terras da Desolação… 

Na última imagem podem ver as doze capas deste excelente série.







Nestor Burma – Du Rififi à Menilmontant

Nova BD com a personagem Nestor Burma e com as rédeas da aventura a serem retomadas pelo nosso conhecido Jacques Tardi. Desta vez, o nosso (não) herói criado pelo escritor Leo Mallet anda pelo XX ème arrondissement (fico sempre com dúvida se a tradução melhor é distrito ou bairro) de Paris.

Nas aventuras em romance policial de Leo Mallet, Nestor Burma não chegou a ter uma aventura neste distrito de Paris, mas Jacques Tardi, que nele habita, resolveu fazer o seu (não) herói visitar a zona. E é muito isso que ele faz durante toda a aventura: vai para trás, para a frente, percorre as mesmas ruas, vai aos mesmos bares e cafés dias e dias a fio. Sobe escadas, desce escadas, e encontra frequentemente o Pai Natal.

Efetivamente estamos perto da época de Natal, e uma marca de medicamentos contratou um conjunto de pessoas para carregar umas placas publicitárias, vestidos de Pai Natal. Curiosamente, essas personagens – no caso três irmãos – vão ter uma importância relevante para o desenlace da história, para além de funcionarem - umas manchas vermelhas num cenário cinzentão de inverno - como uma espécie de sinal inquietante de perigo, o que não deixa de ser irónico.

Manchol é a marca de medicamentos, e é também o apelido do cadáver encontrado debaixo do piano, com dois tiros que lhe foram aplicados, sabemo-lo desde o início, pela sua mulher que, por sua vez, aplica um terceiro tiro diretamente na sua têmpora, durante uma visita ao nosso detetive privado, criando-lhe o incómodo de ver o seu escritório selado pela polícia. Esse incómodo profissional tem duas agravantes: a primeira é que Nestor Burma habitava também nesse mesmo espaço e acaba por se ver obrigado a ter de se mudar para um pequeno hotel no XXº Distrito. A segunda é que a “suicida viúva assassina” lhe deixou uma carta com instruções que, para evitar que fosse apanhada pela polícia, Nestor esconde na casa de banho do seu apartamento/escritório, o que o impede de a ler durante todo o tempo em que a polícia por lá anda.

Manchol é ainda a marca de medicamentos (gotas para o nariz e gotas bebíveis) de caixa vermelha que Nestor Burma carrega durante boa parte da sua investigação, uma vez que está com uma valente gripe, (o que lhe vai valer, aliás, alguns maus acolhimentos), sendo que aquela caixa vermelha lhe vai permitir conhecer uma personagem (La Biture – tradução, literalmente “a bebedeira”) um pouco ofensiva ao olfato, mas conhecedor de muitos detalhes importantes para a investigação. Ah, e grande amigo de gatos!

O desenho de Tardi, como sempre, é notável, os detalhes humorísticos e satíricos, são muitos e divertidos, apesar de ser notório que o autor já não está no topo da sua forma. Quanto à história, há que reconhecer que apesar dos quilómetros percorridos por Nestor Burma, apesar dos hectolitros de álcool absorvido por algumas das personagens, apesar do número de visitas a cafés e bares, apesar do número de espirros “ranhosos”, apesar dos vários disparos, apesar do número de defuntos, na prática, pouco se passa. O burlesco, a crítica social, os detalhes das ruas e dos espaços, a relação de Burma com a sua secretária, com a polícia e com o seu amigo jornalista, são o sumo desta aventura, interessante, bem-disposta, em que a pergunta mais repetida é se acreditam no Pai Natal.

Editado pela Casterman, a aproximar-se das 200 páginas, faço notar que Nestor Burma acaba esta aventura curado da sua Gripe.






1 comentário:

  1. Acho que arrondissement pode ser traduzido por bairro, salvo melhor opinião

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