sábado, 23 de julho de 2022

As opiniões de Miguel Cruz sobre: "I.R.$. - Fraude à la Terre – tomo 23", de Desberg e Vranken e "T’Zée – Une Tragédie Africaine", de Appollo e Brüno

Aqui ficam para hoje mais duas boas leituras de BD com opinião de Miguel Cruz.



I.R.$. - Fraude à la Terre – tomo 23

Vamos lá falar de um outro “Bestseller”, de Desberg (argumento) e Vranken (desenho), de que vários tomos foram já editados em Portugal: I.R.$..

Em Junho foi colocado à venda o tomo 23 desta série da Lombard, sendo que o número impar significa, tal como com Largo Winch, o início de uma nova aventura a desenvolver no conjunto de dois tomos.

Larry B. Max é, desde há alguns tomos, Senador dos Estados Unidos, mas continua (nostalgia do seu passado como investigador do Fisco??) a dedicar-se a tentar resolver problemas e situações concretas, seguindo os fluxos financeiros que estão na origem ou que contribuem para o agravamento do problema.

E neste caso, o problema de partida – que afeta diretamente o nosso Senador – está nos incêndios, difíceis de controlar e com impactos graves do ponto de vista da sustentabilidade e saúde pública, na Califórnia. 

No essencial, a questão está em seguir os negócios, a rede e os fluxos financeiros de um conjunto de empresas que vivem de negócios com implicações diretas no aquecimento climático global. Inicialmente nos Estados Unidos, a “investigação” dirige-se para outros centros financeiros, e encontra destinatários óbvios em originários do médio oriente e da Rússia.

No meio de tudo isto, várias forças vão desenvolvendo ações em defesa dos seus interesses, incluindo lançando a espectável “mulher fatal” para “dar conta” do nosso herói. É preciso não conhecer Larry B. Max como nós. A aventura está lançada, é movimentada e com raros momentos de pausa, apesar do detalhe contextual e de relação entre a rede de interesses.

A receita que fez sucesso mantém-se, mas o tema e a abordagem são interessantes, os desenhos de uma qualidade excecional, como em volumes anteriores. Acompanhamos alguns estereótipos, Larry B. Max continua totalmente incorruptível, a narrativa é inteligentemente bem construída, e termina esta primeira parte com um suspense muito bom.

Os indefetíveis da série, e deste tipo de aventuras encontram aqui mais um tomo de qualidade e que acrescenta valor à série.






T’Zée – Une Tragédie Africaine

Começo por uma clarificação: Este comentário não foi motivado, nem nada tem a ver com a morte do ex-presidente de Angola, nem com as negociações família-governo que se seguiram. Nada na história se aproxima à situação de Angola, embora ela seja mencionada e insinuada num ou noutro ponto.

T’Zée, prioritariamente inspirado em Mobutu (fisicamente e na maneira de vestir, pelo menos), é o ditador, há dezenas de anos, de um país não definido da África Central. Figura relevante do exército de libertação do seu país, foi essencial para a pacificação do país e demorou alguns anos a encetar uma deriva autoritária, que está em vias de terminar, com revoltas diversas em todo o país. 

Ao longo de 5 partes distintas e de quase 150 páginas, vamos assistindo à evolução do anunciado processo de queda do regime, mas quase sempre à distância, pois a narrativa é centrada numa intriga palaciana que tem como personagens de destaque o filho mais novo (e único vivo) de T’Zée – Hippolyte que estudou em França, mas que está agora na ilha de Gbado, de difícil acesso, e infraestruturada por seu pai, que aí instalou um palácio familiar – e Bobbi, jovem segunda mulher de T’Zée.

Estas personagens são acompanhadas por diversas outras, nomeadamente os melhores amigos de Hippolyte – um Libanês e a filha de um antigo e destacado companheiro de armas de T’Zée, que este condenou à morte – e a melhor amiga de Bobbi, particularmente dotada na já referida intriga palaciana.

T’Zée morreu? O regime cai? Quem está a apoiar quem? Há dinheiro para pagar ao exército e a mercenários? Tudo isto ajuda a criar incerteza e um ambiente difícil em Gbado. Mas a complexidade verdadeira está no desenvolver das relações entre as personagens, e a inveja e o ciúme são forças terríveis que conduzem a um desenlace imprevisível quando começámos a leitura.

A narração é muito interessante, com diversos flash-backs que permitem conhecer motivações e caráter de várias das personagens, todas elas fortes, interessantes e com muitas peripécias para serem conhecidas. A história é muito detalhada, trabalhada com grande profundidade, nada é deixado ao acaso, e vamos sendo surpreendidos por uma narrativa sempre consistente.

Quer a história de Appollo, quer o desenho de Brüno (que já bem conheço de outras BDs) constituem elementos muito consistentes com esta “aventura” Africana editada pela Dargaud, são ambos de grande qualidade (admito que não para todos os “corações”), criando uma obra digna de atenção.



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