Ao ver a capa começamos logo a perceber ao que vamos. Uma mulher devastada e nas suas costas um cenário de destruição. Esperava-se uma leitura dura. E foi.
Katya - La Guerre.Partout.Toujours, editado pela Casterman, é o primeiro álbum do autor Antoine Schiffers. A história decorre no ano de 1998 e a protagonista é Katerina, uma mulher de origem chechena, que vive exilada em Berlim, há já uma década.
Katya vive atormentada pela filha que deixou na Chechénia e ao acompanhar pelos noticiários as imagens da sua terra Natal devastada pela guerra, decide partir para Grozny, na esperança de encontrar a sua filha desaparecida, Katya.
Já na Chechénia, Katerina vai deparar-se com a brutal visão de um país completamente destruído, com a população traumatizada e transformada pelos horrores que viveu. Na sua jornada para tentar recuperar Katya, as coisas não lhe correm de feição e vai ter de lidar com oportunistas, ladrões, gente sem escrúpulos, e é Malik, um jovem com quem se cruza, que lhe dá alguma esperança. Malik é um adolescente que ficou sozinho, entregue a ele próprio, que tenta sobreviver, e que lhe serve como uma espécie de guia e juntos fazem um road-trip pelo país destruído. Entre eles vai-se criando uma relação de amizade que se transforma, face à solidão que os dois sentem, num enorme carinho quase de mãe para filho e vice-versa. Embora efémero e frágil eles tornam-se no único porto de abrigo para cada um deles e ao mesmo tempo uma réstia de esperança e de humanidade.
O leitor assiste à sua road trip desenhada pelo meio de ruinas e destroços e aos vários percalços e perigos que acontecem pelo caminho.
Neste livro, Antoine Schiffers não nos dá apenas a conhecer a história de Katerina ou de Katya. O autor dá voz às mulheres, normalmente mais discretas, que sofrem muitas vezes em silêncio as tragédias de que são vítimas nos conflitos armados. Perdem os seus filhos, os seus maridos, os seus pais, irmãos e irmãs, perdem amigos, perdem as suas casas, perdem o seu mundo.
No contexto internacional em que vivemos, com inúmeros conflitos armados a acontecer, esta narrativa é muito pertinente e actual e dá-nos uma outra visão. Os traumas de guerra, a coragem de seguir em frente, de recomeçar, sem nunca esquecer o que ficou para trás. É nua e crua, é violenta e triste, mas ao mesmo tempo mostra-nos como ainda pode haver compaixão e bons sentimentos, quando tudo à volta conspira para o horror.
Bela estreia do autor!
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