Tivemos o prazer de entrevistar Pierre-Henry Gomont, no Festival Internacional de Banda Desenhada de Beja, a 31 de maio deste ano, quando o autor esteve por ocasião do lançamento do primeiro volume da sua obra “Slava”, editada pela ASA. Ao autor e ao editor Luís Saraiva, agradecemos por esta agradável conversa que aqui transcrevemos.
Publicamos aqui hoje a primeira parte da entrevista e ainda esta semana publicaremos a segunda parte.
Juvebêdê (JBD) - O
lançamento do primeiro volume de Slava, em França, aconteceu alguns meses
depois do início da Guerra da Ucrânia. Foi uma coincidência?
Pierre-Henry Gomont (PHG) –
Não, nada disso. Bem, todos sabíamos que a Guerra não estaria muito longe. A
Rússia já tinha invadido a Crimeia e já tinha invadido a Geórgia e, portanto,
não foi propriamente uma surpresa. No entanto, quando aconteceu, entrei
completamente em stress e questionei-me se valia a pena continuar e concluir o
projecto. A guerra foi declarada em fevereiro de 2022 e nessa altura eu já
tinha concluído três quartos do livro e encontrava-me a trabalhar nele há 12
meses.
Mas depois compreendi que se
calhar era bom que dar a conhecer mais alguma coisa sobre os russos. Em França
a percepção que existe dos russos é muito negativa e compreendemos o porquê.
Mas a meu ver, essa percepção tem a ver com os políticos e com os
dirigentes. Porque o povo russo não
corresponde a essa imagem negativa. É muito diferente, muito díspar e
heterogêneo. Portanto eu prefiro primeiro compreender as pessoas, do que
julgá-las à priori. Assim, com este livro, é permitido ao leitor compreender um
pouco mais este povo e colocar-se no lugar dos russos.
JBD – Permite conhecermos
ou outro lado da história
PHG – Isso mesmo! Permite
que sintamos empatia, porque há muitos russos que não estão de acordo com esta
guerra. E quando eu me dei conta disto, ganhei um novo fôlego para concluir o
livro.
JBD – És um homem de
muitos ofícios. Sociólogo, economista… Estas duas vertentes permitem-te
encontrar temas completamente diferentes para as tuas histórias? Temos “Afirma
Pereira”, temos “Slava”, histórias distintas e que se passam em momentos
distintos.
PHG – A Sociologia e a
Economia agrupam muitos temas, porque as ciências políticas nunca estão muito
longe umas das outras. A Sociologia é o meio de entrarmos num mundo que não
conhecemos e de passarmos à descoberta. E
do ponto de vista económico, por exemplo, no que diz respeito ao Slava, se eu
não tivesse estudado economia, não teria compreendido todos os mecanismos
financeiros existentes e interessou-me muito saber como funcionava economicamente
a compra das minas, que eram na verdade desmanteladas, revendidas e assim se
tornavam numa forma de enriquecimento. Aconteceu em França na década de 1980, faz
parte da história e da economia e tudo isso fez parte dos meus estudos.
E mais, quando viajo vou para a
Geórgia, a minha maneira de questionar o mundo em que estou inserido vem da
sociologia. Uma das minhas maiores referências para Slava é a obra de uma
autora bielorussa, Svetlana Alexijevich. A forma como constrói os seus livros é
muito interessante do ponto de vista sociológico. Ela coloca as histórias de
diferentes pessoas em perspectiva. Num capítulo, é uma pessoa que conta sua
história e aí dá o mote para outra pessoa que conta sua história, então a
imagem que temos é uma espécie de mosaico como as diferentes visões. Essa
leitura para mim foi muito importante, então a sociologia está sempre presente
em tudo o faço.
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