Le Dernier Vol de Dan Cooper
Dan Cooper, para muitos, é uma personagem bem conhecida de Banda Desenhada, do autor canadiano Albert Weinberg, e que foi uma das primeiras bandas desenhadas sobre aviação (juntamente com Buck Dany e Tanguy et Laverdure, por exemplo). Esta Banda Desenhada, no entanto, apenas cruza com Dan Cooper através do nome e de um álbum de banda desenhada que é lido e manejado logo nas primeiras páginas – presumindo-se que é daí que foi obtida a inspiração para o nome falso.
Simplifiquemos.
Um tal de Dan B. Cooper embarca, em novembro de 1971, num voo interno nos Estados Unidos, com direção a Seattle, ameaça a hospedeira (delicadamente mostrando-lhe uma bomba artesanal que tem numa mala) e desvia o avião, exigindo 200 mil dólares (se fizermos um cálculo simples de atualização pelo índice de preços ao consumidor, seria um pouco menos de 2 milhões de dólares à data de hoje). Os 200 mil dólares são-lhe entregues, o avião esvaziado de passageiros levanta voo em direção ao México, e ele, que não se chama Dan Cooper, seguindo um plano cuidadosamente elaborado, salta de paraquedas.
Curiosamente, esta história é verdadeira. Saltou de paraquedas e nunca mais ninguém dele ouviu falar. O FBI, é referido na BD, só encerrará o dossier em 2016. Não conhecia o caso, fiquei depois a saber que há várias “teorias da conspiração” associadas a esta “aventura”. E esta parte da BD é muito interessantemente contada por Jean-Luc Cornette, e bem desenhada, num estilo realista e sóbrio por Renaud Garreta.
A história não é, contudo, um mero relato dos acontecimentos. O que os autores procuram fazer é imaginar um contexto para este acontecimento extraordinário. Estabelecem uma cumplicidade feminina para o aventureiro, e imaginam o que se passou após o salto em paraquedas. A “aterragem”, a fuga, peripécias, e o exílio no México, onde a sua cúmplice loira o vai encontrar.
Trata-se de uma história simples, imaginativa e interessante, claramente uma breve aventura, tipo “série B”. O final, mesmo aqui, é deixado em aberto, o que ajuda a uma leitura agradável e à credibilidade do exercício. Um desenlace possível. O desenho apresenta um estilo clássico, realista (como já tínha referido), procurando associar-se às BDs que criaram o género de aviação e, particularmente, ao estilo de A. Weinberg em Dan Cooper.
Lê-se bem, um exercício simpático, nada pretensioso, uma edição da Glénat, uma capa curiosamente bem conseguida.
Uma BD sobre um desenhador, razoavelmente famoso, Fred Remington, que apresentou imagens notáveis sobre o Oeste americano. No entanto, a história não é real, e o encontro entre Remington e o chefe guerreiro Apache Geronimo, descrito neste álbum, ao que tudo indica não aconteceu.
Uma história estranha, sensível, mas muito pouco linear, e muito pouco agradável.
Ora então, para que estou eu a falar sobre uma BD pouco agradável? Porque a história é plena de acontecimentos interessantes? Não, verdadeiramente, a história é mais uma “visita” introspetiva de Remington, e uma “fotografia” do tratamento a quer os nativos americanos foram sujeitos. Porque a BD é plena de otimismo e esperança no futuro? Não, nem por isso, até é mais marcada por uma elevada dose de fatalismo? Porque é uma obra editada pela Dargaud, de responsabilidade de mais dois autores espanhóis (Sagar Fornies e Josep Maria Polls), que ganham acrescido destaque? Não, podia ser, esse tema da vasta presença espanhola na Banda Desenhada dita Franco-Belga é muito interessante de discutir, mas não pensei sequer nisso. Porque o desenho é excecionalmente atrativo? Não. O desenho é muito adequado aos ambientes e a uma situação verdadeiramente louca e sem contexto, sem grandes referências, sem linhas orientadoras para o jovem Remington. O desenho é adequado, as cores são adequadas, o retrato apresentado é sério, sujo, brutal, desagradável, porque é a realidade retratada – ah, acresçam lá traiçoeiro…
Portanto, escrevi um parágrafo inteiro que parece indicar que desaconselho a leitura ou, pelo menos, não consigo encontrar uma razão válida e substancial para a aconselhar. É o dilema que tive com esta BD. A leitura foi longa, e fiquei um pouco sem saber o que dizer. A história é muito particular, realista, agressiva, e fundamentalmente honesta. É o que é!
Curiosamente, o conjunto funciona. Racionalmente poderia dizer que isto ou aquilo podia ser melhor. E posso dizer que não é uma leitura para todos. Mas funciona: prende a atenção, é imersiva a experiência, compreendemos perfeitamente o que está em causa, sentimos o desconforto das personagens, percebemos que o desenlace é inevitável, vibramos com a traição, ficamos muito marcados pela morte (especialmente de uma personagem), e descoraçoados com a reação de outros a essa morte. Percebemos a homenagem aos nativos americanos, com algum distanciamento, e com uma sensação de desconforto geral.
Se pensarmos bem, se uma BD nos toca, o que de mais positivo podemos dizer? Acredito que alguns não gostarão, outros não aderirão, afinal o tema não é particularmente animador. Direi que vale a pena a leitura, até porque varia, o que não constitui motivo despiciendo, mas reconheço que fiquei surpreendido com a aposta de risco de uma das maiores editoras de Banda Desenhada.




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