terça-feira, 31 de maio de 2022

Fanzine "Outras Bandas" #7 - Heróis Portugueses II, foi lançado no Festival de Beja


Fanzine "Outras Bandas" #7 – Heróis Portugueses II, mais outro lançamento que decorreu no Festival de Beja.

Após ter sido realizada, entre 2020-2021, a iniciativa inédita "Heróis Portugueses", em que os autores do colectivo informal Tágide ilustraram tributos aos 100 principais personagens da Banda Desenhada portuguesa, compilada posteriormente no fanzine Outras Bandas #5 (Setembro de 2021), o grupo retomou o mesmo desafio no primeiros semestre de 2022, com uma segunda ronda do projecto, desta vez celebrando outras 50 das mais famosas personagens da BD nacional, que são reunidas agora no Outras Bandas #7.

Com personagens bem conhecidas do público, entre figuras clássicas e criações contemporâneas, houve ainda espaço para recordar alguns heróis desaparecidos, assim se procurando cultivar uma memória viva da Arte Sequencial portuguesa e prestar uma justa homenagem aos autores, que desde o século passado trouxeram o sector da BD lusitana até aos mais auspiciosos dias de hoje.
Definitivamente, com 150 heróis de quadrinhos destacados, já não se pode argumentar que a Banda Desenhada portuguesa não é feita de heróis, como noutros países, ou de que estes pecam em carisma suficiente para se implementar no mercado.

Tal como antes, os critérios de selecção passaram por escolher personagens clássicos, modernos e contemporâneos, e privilegiar o destaque a heróis de apresentação icónica e não tanto a protagonistas de novelas gráficas; razão porque ficaram de fora certas obras fundamentais da BD nacional. Tanto quanto possível, procurou-se ainda seleccionar heróis que tenham constituído uma colecção ou sido publicados/reeditados em vários títulos, assim se legitimando a sua popularidade.

O projecto contou com contributos pela quase totalidade dos membros do colectivo informal: António Coelho, Daniel Maia, Filipa Lopes, Henrique Gandum, João Raz, Jorge RoD! Rodrigues, José Bandeira, Maria João Claré, Mário André, Nuno Dias, Patrícia Costa, Rafael Marquês, Rui Serra e Moura, Sérgio Santos, Susana Resende, Shania Santos e Yves Darbos.

Outras Bandas #7 – Heróis Portugueses II é uma edição independente, respeitadora do Direito de Autor dos criadores aqui representados, que estão inteiramente creditados. A ilustração de capa e da Patrícia Costa (arte) e do Daniel Maia (grafismo). 



City Hall - Primeira manga publicada pela Gradiva, já em pré-venda!

 


A Gradiva continua imparável somando já vários livros de Banda Desenhada editados este ano. Agora surpreende ao lançar a sua primeira manga. Trata-se do primeiro volume da série City Hall, com desenhos de Guillaume Lapeyre e argumento de Rémi Guérin. Eis a sinopse da editora:

Um mundo onde se acabou com o papel. Porque o papel criou uma ameaça terrível para a humanidade: o que se escrevia manualmente podia transformar-se em realidade! E as «personagens» criadas ganhavam vida e, em certos casos, até «vontade própria» (como robôs avançados). Estão a ver o que começou a acontecer? Coisas horríveis! Então, internacionalmente foi tomada a decisão de eliminar o papel e vestígios do mesmo. Passou apenas a ser permitida a escrita digital. Só que nem sempre o que se julga acabado teve realmente um fim…













segunda-feira, 30 de maio de 2022

"Eu, Mentiroso", de Altarriba e Keko, foi lançado em Beja, numa conversa memorável



Temos tanto para vos contar sobre o Festival de Beja, mas para já começamos por aqui. A organização convidou-nos para conduzirmos dois dedos de conversa com os autores António Altarriba e Keko (Godoy). Já os conhecíamos antes e foi um enorme prazer estar de novo com estes grandes senhores da Banda Desenhada espanhola. Minutos antes da conversa, foi apresentado o título "Eu, Mentiroso", o terceiro livro da trilogia do "Eu", da autoria dos dois, que deu o mote para a hora seguinte de conversa. 

Foi memorável, e temos pena de não ter sido gravada, porque era muito bom poder partilhar com todos, o privilégio que tivemos de ouvir os dois autores a falarem do seu trabalho.

"Eu, Mentiroso" segue-se a "Eu, Assassino" e "Eu, Louco" e o conjunto da obra é considerado como uma "autópsia ao sistema político contemporâneo".

Editado pela Ala dos Livros, completa assim uma obra intensa e perturbadora, que segundo Altarriba, não pretende tirar-nos a esperança, mas antes ser um alerta. Uma história intensa e complexa de intriga política que se cruza de forma magistral com os volumes anteriores da trilogia. Altarriba constrói um argumento denso e profundo que é também uma reflexão sobre o mundo da política, da duplicidade e das falsas aparências.

No desenho, depois dos negro e vermelho do sangue e do negro e amarelo da loucura, Keko apresenta-nos o negro e verde da mentira.

A foto é da Ala dos Livros.


domingo, 29 de maio de 2022

Especial 25 anos! - Os parabéns de Daniel Maia

 


Recebemos mais um desenho alusivo aos nossos 25 anos, desta vez oferecido pelo Daniel Maia. Adorámos este personagem que segura na nossa revista, como se fosse algo confidencial. Obrigado Daniel!

São tantos os projectos em que o talentoso Daniel tem estado envolvido, que será complicado enumerá-los. Mas podemos aconselhar a leitura do seu mais recente livro, editado pela Ala dos Livros, intitulado "Co.Br.A - Operação Goa", que assina com Marco Calhorda.

Devido à pandemia, já não estamos com o autor há algum tempo, e esta fotografia é de 2017, tirada no Amadora BD.




BDs da estante - 479

 


Mais uma releitura de Tintin. As 7 bolas de Cristal, o 13.º livro das aventuras do famoso repórter de Hergé. Edição da ASA de 2011.

Uma misteriosa doença afecta os membros de uma expedição arqueológica recentemente regressada dos Andes, onde descobriram uma múmia. Um por um, os membros da expedição ficam em estado de letargia. As únicas pistas são uns estilhaços de cristal encontrados perto de cada vítima, pertencentes a bolas de cristal. Preocupados com a situação, Tintin, o Capitão Haddock e o Professor Girassol visitam um amigo do último, o Professor Hipólito Bergamotte, o único membro da expedição ainda de boa saúde. É em casa deste que se encontra a múmia do inca Rascar Capac a qual desaparece misteriosamente. A situação complica-se ainda mais quando o professor Girassol descobre uma pulseira de ouro pertencente à múmia e a coloca no seu pulso…


sábado, 28 de maio de 2022

World Press Cartoon - Hoje! - entrega de prémios e inauguração da exposição

 


A par do Festival de Beja, este é outro grande acontecimento deste fim de semana. Decorrerá hoje a cerimónia da entrega dos prémios da edição 2022 do World Press Cartoon. E será também inaugurada a exposição que reúne as obras seleccionadas, mais de 200, de cartoonistas oriundos de 65 países. 
Tal como nos últimos anos, tudo isto acontece nas Caldas da Rainha e a exposição estará patente até 28 de Agosto.

sexta-feira, 27 de maio de 2022

Já lemos o último álbum da série Armazém Central, que vai ser lançado amanhã no Festival de Beja


E eis-nos chegados ao fim desta maravilhosa história. Tendo em conta que amanhã, a convite da Arte de Autor, vamos apresentar o último álbum da série "Armazém Central", no Festival de Beja, já tivemos o privilégio de o ler. E se tivéssemos que o resumir em poucas palavras diríamos apenas "uma obra de arte". Não é um exagero da nossa parte, pois se já gostávamos desta série, temos que vos dizer que a série encerra com chave de ouro, pois este último álbum duplo, com o oitavo e nono capítulo, é sem dúvida o melhor de todos. 

Depois de Marie (1), Serge (2), Os homens (3), Confissões (4), Montreal (5), Ernest Latulippe (6) e Charleston (7), as últimas partes da história têm como títulos, "As mulheres" e "Notre-Dame-des-Lacs".

Começamos por relembrar que o primeiro volume se inicia em 1926, na aldeia de Notre-Dame-des-Lacs, no Quebeque, Canadá. Uma aldeia parada no tempo, retrógada, onde cada mudança era mal vista e tida como uma ameaça. No entanto, a morte de Félix Ducharme, dono do armazém e centro da pequena povoação, vai traduzir-se na ignição da transformação da aldeia. Este acontecimento vai ditar várias alterações ao dia a dia de todos e quando a jovem viúva Marie decide tomar as rédeas do negócio e ter a coragem de conduzir o velho camião do marido, a sua atitude por um lado é um alívio para a gente da aldeia, por verem garantido o fornecimento de bens necessários, mas por outro vai ser alvo de comentários desdenhosos pelas alcoviteiras, tendo em conta que não era comum uma mulher conduzir nos anos 20. Outros acontecimentos, como a mudança do padre, em que o actual é muito mais moderno e liberal e a chegada de um forasteiro, que por ali vai permanecer, são mais duas peças fundamentais para a metamorfose da aldeia.

A cada álbum que fomos lendo, fomos notando a mudança a acontecer naquela aldeia e com cada uma das personagens. Mas neste último, é que nos damos conta que Notre-Dame-des-Lacs (passados dois anos na história) já não é a mesma aldeia que conhecemos no primeiro capítulo e foi virada de pernas para o ar. Agora é que apercebemos que se deu uma metamorfose e que os personagens conheceram enfim a liberdade e a felicidade. Ou melhor, aprenderam que cada pessoa pode lutar por aquilo que a faz feliz. E ainda, no nosso caso, apenas neste último nos damos conta da importância do narrador da história e na própria mudança que vai acontecer no seu discurso, que no fundo se funde com a alma da aldeia, sendo ele próprio uma alma, o falecido Félix.

Que bela lição e que bela mensagem nos são dadas pelos autores. Toda a história é um hino à tolerância, à liberdade e ao amor. No ser humano há sempre uma tendência para julgar quem pensa ou age de forma diferente e esta série leva seguramente o leitor a reflectir sobre estas matérias. Régis Loisel e Jean-Louis Tripp dedicaram vários anos ao "Armazém Central" e conseguiram, com talento e inteligência, oferecer-nos uma história fantástica que nos fala sem pudor da tristeza, da insegurança, da coragem, do preconceito, da inveja, da igualdade, do amor, da emancipação feminina, da velhice e da aceitação.

Neste livro, mais do que nenhum outro da série, percebemos que todos podemos ser felizes, quer estejamos mais gordos, quer sejamos mais baixos, quer já não sejamos novos, no fundo, que a felicidade está ao alcance de todos, independentemente do que quer que seja.

Uma palavra para o trabalho a quatro mãos dos autores. Tanto ao nível do argumento como do desenho. Uma dupla fantástica! Inicialmente haviam previsto que a série seria apenas de três livros e afinal o curso da história levou-os mais além. Os desenhos, que são começados por Loisel e concluídos por Tripp, transbordam de ternura e expressividade e ajudam a que toda a história seja absolutamente comovente.

Este último volume é enriquecido com um bónus extraordinário, sob a forma de créditos finais, tratado como um álbum de fotografias reunindo todos os actores desta inesquecível e tão cativante tribo e dando-nos a conhecer o que aconteceu nos anos seguintes ao final da história. 

Sem mais demoras, aqui fica a sinopse dos dois capítulos:

As mulheres

Novamente Inverno. Depois do Charleston, trazido de Montreal por Marie, ter varrido Notre-Dame-des-Lacs como uma fúria, os homens regressaram finalmente à floresta para trabalhar durante toda a estação fria. A calma pode finalmente regressar à aldeia. Mas nada diz que será por muito tempo... Porque Marie, depois de ter partilhado a sua cama com Ernest e o seu irmão Mathurin, descobre que está grávida, sem saber realmente quem é o pai - ela que sempre se achou estéril! Entretanto, Réjean, o jovem padre da aldeia, refugiou-se em casa de Noël, está tão perturbado pelas suas questões íntimas e existenciais que já não é capaz de desempenhar o seu serviço religioso. Os fanáticos da aldeia entram em pânico! Até se fala em ir ao bispo! Aonde é que tudo isto vai levar? Acabou-se o presidente da câmara, acabaram-se os sacerdotes, as danças selvagens, os amantes que vivem em pecado e os filhos sem pai... Não será isto simplesmente o sinal de uma maldição desencadeada em Notre-Dame-des-Lacs?

Notre-Dame-des-Lacs

Já não há presidente da câmara em Notre-Dame-des-Lacs, quase não há padre, Marie grávida de um pai que ninguém conhece, e as mulheres da aldeia num frenesim de compras como nunca antes se viu... O mundo foi para o inferno, lá em baixo na zona rural do Quebeque? É este o trabalho do diabo, o início do fim?

Não, claro que não, porque o que permeia cada imagem, cada cena, cada diálogo e cada personagem neste espectacular desfecho sob a forma de uma apoteose alegre é a felicidade! Loisel e Tripp tiveram obviamente um grande prazer em concretizar o destino de cada um dos protagonistas desta história com um humor irresistível, ao longo de alguns meses em 1928, quando passamos da neve profunda para o calor do Verão, tendo como pano de fundo o regresso dos homens da sua campanha. Aprendemos, entre muitas outras surpresas, o que acontece ao barco do velho Noël, o que atormentou tanto o jovem padre Réjean, ou o que esteve por detrás da inesperada gravidez de Marie... E a aldeia de Notre-Dame-des-Lacs, no final deste final febril, celebrado como deveria ser por uma grande fogueira do Dia de Verão, entra por sua vez na modernidade.










Chegou o grande dia! Arranca hoje a 17.ª edição do Festival Internacional de Banda Desenhada de Beja

 


O Festival Internacional de Banda Desenhada de Beja retoma as suas datas habituais, depois do interregno de 2020 e de ter sido realizado em Setembro de 2021. Esta noite, pelas 21 horas, será inaugurada a sua 17.ª edição e nós lá estaremos! É sempre um enorme prazer voltar aonde fomos felizes, o que acontece quando vamos ao Festival de Beja. Este ano com o grato prazer de irmos apresentar o novo e último livro da série "Armazém Central" e de irmos conduzir a conversa com os autores Altarriba e Keko.
Sempre que pudermos viremos aqui mostrar os momentos e os aspectos mais importantes do festival que promete ser bem quentinho. 
Relembramos as exposições e os autores presentes e se quiserem podem consultar aqui a programação.


AFONSO & CHICO - LES PORTUGAIS – França

ANDREA FERRARIS & RENATO CHIOCCA – Itália

ANDREW SMITH – Inglaterra

ANTONIO ALTARRIBA & KEKO – Espanha

ARTUR CORREIA – Portugal

AVENIDA MARGINAL – Portugal - vários autores

BERNARDO MAJER – Portugal

CHLOÉ WARY – França

CRISTÓBAL SCHMAL – Chile

DANIEL HENRIQUES – Portugal

DAVID RUBÍN – Espanha

JAYME CORTEZ – Portugal/Brasil

JEAN-LOUIS TRIPP – França

JOANA ROSA – Portugal

RODOLFO MARIANO – Portugal

TOUPEIRA – HÁ MOVIMENTO DEBAIXO DA TERRA – Portugal - vários autores

quinta-feira, 26 de maio de 2022

As opiniões de Miguel Cruz de dois livros de autores que estarão presentes este fim de semana no Festival BD de Beja!

Com a inauguração amanhã pelas 21 horas do Festival Internacional de BD de Beja, aqui ficam mais duas oportunas opiniões de Miguel Cruz de dois livros de autores que lá estarão presentes, os portugueses Paulo Vaz de Carvalho e João Mascarenhas (O Perigoso Pacifista - Edição A Seita) e a francesa Chloé Wary (A Época das Rosas - Editora Planeta Tangerina e Conduite Interdite - Edição Steinkis).
 
Boas leituras e visitem o Festival de BD de Beja este fim de semana!


O Perigoso Pacifista (Edição a A Seita)
E pronto! Com grande satisfação está lido O Perigoso Pacifista, uma BD de conteúdo biográfico sobre Adriano Correia de Oliveira, da autoria de Paulo Vaz de Carvalho e João Mascarenhas. Tudo é de saudar: o tema, a agradável abordagem a um período da nossa história, os detalhes factuais e alguns anedóticos, o retorno do João Mascarenhas à edição de BD. Não era preciso dizer mais.

De facto, a BD em Portugal vai estando benzinho e recomenda-se, mais, mais.
Sou de uma geração que praticamente não se recorda de Adriano Correia de Oliveira como personagem pública, pois a sua morte chegou muito cedo. Mas a sua voz sempre foi perfeitamente presente, tal como muitos dos episódios e detalhes aqui narrados com muito interesse e com desenho muito cuidado do João Mascarenhas (que confirma a afirmação de José Barata-Moura no prefácio: “…uma articulação inteligente – superiormente conseguida – de textos com imagens e de imagens que são texto”).

O período relatado, e o seu contexto político, no entanto, é-me presente por ter sido um período intenso para a geração dos meus pais e dos meus avós. Adicionalmente, alguma realidade de Coimbra faz parte do meu imaginário, afinal uma grande parte da minha família viveu e vive por lá. E a voz, aquela voz que me é familiar desde criança, é notável.

Sim, é verdade, a evocação da vida de Adriano Correia de Oliveira e do seu cruzar de vidas com outros como José Nisa ou Manuel Alegre (A Trova do Vento que Passa, pois então!) ou Fausto para citar apenas alguns, implica necessariamente, a partir de uma determinada geração ou idade, uma viagem nostálgica e reaviva a imensa saudade de alguns cujas frases, imagens, pensamentos nos marcaram, e, obviamente, de entes queridos que já nos deixaram. É sempre bom recordar.

Para os leitores mais novos, esta BD editada pl’ A Seita é uma viagem plena de informação, descrição bonita de uma determinada vivência, retrato de uma época, e curiosidade, tendo ainda o bónus de vir acompanhada de um CD com uma voz que, e cito o texto que sai da boca de Manuel Alegre na página 20: “…está carregada desse não sei quê antigo que trazemos no sangue, como o apelo do mar e o amor da terra e do nosso próprio ser”.





Conduite Interdite (Edição Steinkis)
Existia uma alternativa. O destino de uma mulher não pode estar traçado desde a sua nascença. Ser uma mulher não tem de ser um fardo… Este extrato é retirado de Conduite Interdite, uma BD de Chloé Wary, já com mais de um ano, mas que resolvi abordar aqui, atenta a presença próxima da autora em Beja.

Nesta BD, a personagem central volta à Arábia Saudita após viver 5 anos em Londres, ida e volta determinadas pelos afazeres profissionais do seu pai que, aliás, não reagiu bem a alguma independência que a filha foi adquirindo durante a sua estadia em Inglaterra.

Nour, a nossa personagem, pelo contrário, desenvolveu uma consciência particularmente profunda sobre o papel da mulher, as oportunidades (entre outras profissionais), da sua independência, e está particularmente preocupada com este retorno a casa no ano de 1989 – simbolicamente tem de se cobrir com o véu assim que a aterragem é anunciada. Em Londres dedicou-se à – e estudou – fotografia, o que, aliás, lhe permitiu ficar com registos desse período de liberdade.
Com muita dificuldade de adaptação, Nour volta a ter um papel secundário numa sociedade patriarcal e, apesar de o seu marido – de casamento arranjado – (também ele tendo estudado no ocidente), ter alguma sensibilidade para a situação e anseios da sua esposa, procura formas de mostrar revolta face ao seu enquadramento social.

Essa revolta simbólica surge quando um grupo de mulheres decide “pegar” num conjunto de 15 viaturas e conduzir, num país onde até 2018 as mulheres estavam proibidas de o fazer. As consequências são as esperadas numa sociedade Saudita no ano de 1990.

É um livro curto, a preto e branco, que descreve, com base numa história simples, uma sociedade sobre a qual conhecemos pouco – e que hoje, apesar de tudo é diferente da de 1990. De leitura rápida, a história é narrada de modo sensível, com desenhos agradáveis, estruturas assimétricas que procuram contrastar as barreiras sociais com um desejo de liberdade.
A estrutura de cada página (as vinhetas todas diferentes umas das outras) é diferente da do livro da autora que foi publicado em português, pela Planeta Tangerina – A Época das Rosas, e que apenas vim a ler mais tarde. Duas obras distintas, duas obras interessantes. Uma a preto e branco e outra a cores. Publicado pela Steinkis.





Vai ser lançada no Festival de Beja uma adaptação de um policial de Fernando Pessoa - "Quaresma, o decifrador - O Caso do Quarto Fechado"

Hoje falamos de mais um livro que vai ser dado a conhecer no Festival de Beja. No Domingo, 29 de Maio, pelas 15 horas decorrerá a apresentação da novela policiária "O caso do quarto fechado" de Fernando Pessoa numa adaptação de Mário André, autor da novela gráfica "A Implosão" adaptada da obra com o mesmo nome da autoria de Nuno Júdice, lançada em 2021 e sobre a qual já aqui falámos. 

Simultaneamente será lançado o fanzine "Doce Emese Canibal"/WARS, do mesmo autor, o qual será oferecido na compra de cada um dos livros.

Numa altura em que é lançada a biografia mais completa de Fernando Pessoa, a apresentação desta novela policiária poderá ser uma "ponte" para o conhecimento mais alargado da obra do artista em que as novelas policiárias representam o seu lado menos divulgado. Esta adaptação para BD é o volume inicial de um conjunto de novelas policiárias da autoria de Fernando Pessoa.

Dados sobre o livro: Capa mole a cores,18X25, 68 paginas, biografias no verso das capas, interior a PB, 12€. Como se trata de uma edição de autor, o livro poderá ser adquirido directamente com o Mário André e os interessados poderão contactá-lo mensagem no Facebook Kustom Rats ou por email: kustomrats2017@gmail.com

Mas agora vamos saber um pouco mais sobre a história:

"Charadas, problemas de xadrez, quebra-cabeças geométricos e matemáticos – alimentava-se destas coisas e vivia com elas como com uma mulher. O raciocínio aplicado era o seu harém".

- Fernando Pessoa, sobre Quaresma, do seu prefácio.

Dr. Abílio Quaresma, o Decifrador, um médico "sem clinica e decifrador de charadas da vida real". Personagem criada por Pessoa há cerca de cem anos (1988-1935), protagonista de novelas policiárias desenvolvidas pelo famoso poeta; um género muito popular nas primeiras décadas do séc. XX, e que era secretamente seu favorito. A escrita das mesmas deu-se durante várias décadas, num conjunto de treze contos – uns mais concluídos e longos do que outros, nos quais a personagem central foi transformada em figura complexa, digna do seu panteão de alter egos.

Em "O caso do quarto fechado", Quaresma é chamado a consultar um cenário perplexante, onde está em causa o suicídio aparente mas difícil por degolação, por alguém cuja personalidade ninguém suspeitaria capaz de tal, num quarto fechado por dentro.








A opinião oportuna de Miguel Cruz sobre o nomeado livro "The Many Deaths of Laila Starr" de Filipe Andrade e Inês Amaro para os prémios Eisner Awards

 


Desta vez tive “pontaria” (só desta!?!). Acabei de ler o The Many Deaths of Laila Starr na véspera da sua nomeação para os Eisner Awards. Editado no início deste ano, alguns acidentes e demoras de entrega (uf…) fizeram com que só agora lesse a coletânea em que o argumentista, o desenhador (e colorista) e a co-colorista fossem nomeados. Ok, é verdade, não foi “pontaria”, foi mero acaso…

Confesso, aliás, uma desatenção imperdoável da minha parte: é que só me apercebi da existência deste volume que junta os números 1 a 5 depois de ter sido editado em França e na Bélgica, e devido a um aviso de um amigo português que vive em Bruxelas. 

O Indiano Ram V (Batman, Catwoman, Swamp Thing, …) imaginou uma história surpreendente, estranha, fantasiosa, poética, por vezes dura, mas uplifting. O “nosso” Filipe Andrade apresenta-nos um desenho de grande qualidade, atrativo, animado, e com cores absolutamente magníficas, no que teve a ajuda de Inês Amaro.

Laila é uma jovem que, numa quarta-feira de dezembro, está no parapeito da janela do seu apartamento em Mumbai, a uma distância mortal do solo, justamente no mesmo momento em que a morte – sim, essa – depois de chamada ao gabinete do chefe é enviada “lá para baixo” para viver uma vida mortal…como a jovem Laila Starr.

Ah, é verdade, a Sr.ª Shah, (presa num engarrafamento “monstro”, e já bastante enervada, quase dá à luz antes de chegar ao hospital) torna-se mãe de uma criança que vai ser importante nesta narrativa, e que vai ser intensamente procurada pela Laila Starr… ou pela morte… enfim, pela morte como Laila Starr.

Complicado? Talvez seja relevante assinalar que o grande problema é que a humanidade poderá estar prestes a descobrir o segredo da imortalidade, e a morte consegue passar a ser mortal precisamente na data em que o futuro criador da imortalidade nasce. Cabe à morte evitar essa descoberta (ou não) ou ficará sem emprego… e mortal – na pele de Laila Starr. 

Esta é a história base deste Comics editado pela Boom! Studios.

Trata-se de uma obra que acaba de originar algumas nomeações para Eisner Awards, e isso não é uma coisa pequena. Por isso, não será preciso dizer muito mais, mas se fosse, diria apenas que é uma narrativa extraordinariamente imaginativa e surpreendente, levemente filosófica e um regalo para os olhos. Parabéns aos três nomeados e boa sorte.

E boa sorte também para Filipe Melo e Juan Cavia, nomeados com Balade para Sophie na versão editada no mercado Norte Americano pela Top Shelf. É um achievement importante, testemunho da qualidade do seu trabalho. Thumbs up e boa sorte.

Orgulho.

Miguel Cruz






quarta-feira, 25 de maio de 2022

"Le Scandale Arès", o novo álbum da série Lefranc

Conforme já falámos esta semana, Lefranc, personagem criada por Jacques Martin, celebra os seus 70 anos e a editora Casterman lançou duas obras. Esta, intitulada "Le Scandale Arès" que se trata de uma sinopse original do autor adaptada para estes 70 anos do repórter, e um especial dedicado aos automóveis que vão aparecendo nos álbuns da série.

Eis a sinopse:

Sentados na brasserie Lipp em Paris, Guy Lefranc e Bruno, o seu diretor editorial, ouvem a história de Marlène. Uma jovem alemã que acaba de encontrar as histórias de guerra de seu pai. Este, Karl von Lieds viu em junho de 1940 sua coluna de tanques destruída por dois aviões misteriosos. Único sobrevivente do ataque, o oficial foi transferido para a Frente Oriental, onde morreu alguns meses depois. Nenhuma investigação revelou nada sobre os dois aviões. A hierarquia alemã queria silenciar o caso. Mas agora que a jovem descobriu as cartas do seu pai, está determinada a esclarecer esse caso.