Pois é! O mínimo que se pode dizer de um exercício de “recuperação” das aventuras de Bruno Brazil, abandonado em 1983, após 10 tomos e algumas histórias curtas, é que se trata de um desafio arriscado.
Bruno Brazil é uma daquelas personagens míticas na BD franco-belga, da responsabilidade de dois enormes autores, já desaparecidos: o argumentista, Greg, foi um dos esteios da nossa revista Tintin em português, com Achille Talon, Comanche, Bernard Prince, Zig e Puce, e tantos, tantos outros, que só de pensar nisso tenho de me sentar. O desenhador, William Vance, foi responsável por páginas e páginas de qualidade, juntamente com a sua colorista, Petra, sua esposa, seja em Howard Flynn, Ringo, Ramiro, Bruce J. Hawker, Bob Morane, Marshall Blueberry ou XIII.
Lembremo-nos que esta é uma série em que os autores se permitiram a enorme ousadia de matar alguns dos seus protagonistas.
Estariam, pois, reunidas todas as condições para ter um flop editorial nas mãos. Mas curiosamente, na minha opinião, não é o caso. Se é verdade que o início do tomo 1 destas novas aventuras não é fácil de digerir - com um Bruno Brazil deprimido, com a natural tentativa de recuperar um fio de história abandonado há mais de 30 anos que demora a fluir, e com uma recaracterização de personagens que custa a absorver – depois o que inicialmente se estranhou, acaba por se entranhar, essencialmente devido a uma excelente estrutura narrativa.
O argumento, nesta recuperação da série, ficou a cargo de um experimentado Laurent-Frédéric Bollée (de, por exemplo, a Bomba, recentemente publicado em Portugal), que continua a situar a série na década de 70, caracteriza bem o ambiente envolvente e o comportamento das personagens, ritmando bem as aventuras, com adequado suspense e credibilidade.
O desenho foi assumido por Philippe Aymond (talvez conheçam Lady S.), dono de um desenho elegante, experiente nos enquadramentos e variações de pontos de vista, e habilidoso no mise-en-scène de sequências de ação. No entanto, convém esclarecer que não há, ao contrário de outras séries, qualquer mimetismo do desenho original. Para aqueles que leram as aventuras originais várias vezes, custa a habituar o olho. Hábitos!
Foi muito recentemente publicado o tomo 3, que me surpreendeu muito positivamente, um one shot, na minha opinião superior aos dois anteriores tomos que completavam uma história. O nome não é particularmente feliz - Terror Boreal em Eskimo Point - mas esse é o único reparo a fazer. Quatro personagens na nossa equipa, dois grupos: Bruno Brazil + o Nómada e Whip Rafale + Gaucho Morales.
O segundo grupo investiga um corpo encontrado no porto de pesca de Boston, e são surpreendidos por dois agressores, que atacam Gaucho junto à morgue. Segue-se uma perseguição automóvel em que verificamos que Whip Rafale mantém todos os seus reflexos. No entanto, o mistério é denso, pois o defunto – cujo corpo foi recuperado – sofreu o que aparenta ser algum tipo de mutação genética.
O outro grupo desloca-se então a Eskimo Point de onde partiu o navio onde o corpo foi encontrado, sendo que aí vão “pisar um verdadeiro ninho de vespas”, com a inteligência e a capacidade física e de resistência de Bruno e do Nómada a serem postos à prova.
A publicação da série em Portugal pela Gradiva constitui uma boa oportunidade para acompanhar esta interessante série de As Novas Aventuras de Bruno Brazil.
Miguel Cruz
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