Diverti-me. Importante, nos dias que correm, e tratando-se de uma paródia burlesca originalmente publicada na revista Fluide Glacial. Le Petit Pape Pie 3,14 – ou seja, O Pequeno Papa Pio 3,14 – é uma das duas publicações de François Boucq neste primeiro trimestre de 2022, sendo a outra (tradução à letra) Um General, vários Generais, uma obra humorística, muito crítica, num período final colonial Francês.
Sobre esta segunda obra, prometo comentar brevemente. Já sobre o pequeno Papa que quando pequeno queria ser Papa quando fosse grande, mas que já o é sendo ainda pequeno, vale a pena acrescentar que o desenho de Boucq, só por si vale o interesse. Editado em duas versões, a cores e a preto e branco, tive a oportunidade de “dar uma vista de olhos” a ambas, mas a leitura recaiu sobre a versão a preto e branco que me foi oferecida por um amigo.
A qualidade de desenho é um regalo, com um traço a tinta da china absolutamente e artisticamente fantástico… De tal forma que li o livro, imediatamente após receção, por duas vezes: uma normalmente e outra ignorando os textos e apreciando apenas o que os franceses costumam chamar de “coup de patte”.
O álbum de BD é composto por várias histórias curtas publicadas na revista Fluide Glacial (a começar pela eleição do Papa após o conclave, e que quando vem saudar a multidão à varanda se depara com um pequeno problema: ninguém o consegue ver) e é reconhecido pelo autor como “uma descontração”, apesar do sucesso que a personagem, um Papa de altura muito reduzida, mas com um grande coração. Boucq apostou no humor imprevisível e por vezes poético ou filosófico, com alguns laivos de crítica social, mas sem qualquer abordagem agressiva ou relevante crítica à Igreja.
Mesmo sendo esta uma mera “brincadeira” na prolífica carreira desse grande autor François Boucq, a qualidade do albúm merece a nossa atenção – lembro-me da sua presença no Festival de Banda Desenhada da Amadora, creio que na estação de Metro da Falagueira, a dar autógrafos, mas pedindo que cada um de nós lhe fizesse um desenho no seu livrinho/sketcbook. Nesse ano, o meu pai que, não sei porquê, quis ir a um dia do festival, lá teve de fazer o desenho e perguntou-me se “isto é sempre assim”… Será que Boucq ainda tem o caderninho?
Editada no passado mês de fevereiro, a obra “La Ballade d’Hugo” é apresentada como um One Shot (Será? Eu cá diria que vai depender do sucesso de vendas, porque “a porta” foi claramente deixada aberta para uma segunda parte) que pretende retratar a vida aventurosa desse Grande da Banda Desenhada que foi Hugo Pratt.
Os italianos Bepi Vigna e Mauro de Luca tomaram as rédeas deste projeto, sendo que a escolha do último, identificado como um aquarelista, deve-se à ligação que, em termos gráficos, foi pretendido fazer às extraordinárias capacidades de Hugo Pratt nessa mesma matéria. Foi uma boa escolha.
Não é tarefa fácil, a realização de uma biografia que não seja maçadora - nunca é tarefa fácil, nem mesmo quando o autor teve uma vida que pouco deve a um romance de aventuras. O que é certo é que os objetivos são razoavelmente bem atingidos. Para quem quiser conhecer um pouco mais os meandros da vida de Pratt, identificar aqueles que com ele mais privaram e que, naturalmente, contribuíram para que se tornasse num dos mais célebres autores de BD, num volume de fácil leitura, com desenhos excelentes e agradáveis, contendo ainda algumas referências biográficas explicativas e fotos, tem aqui uma obra merecedora de referência.
A biografia é concentrada no seu período de juventude, passado em grande medida na África Italiana da década de 30 do século passado, e focada em experiências que a nossa imaginação rapidamente associa a episódios marcantes das aventuras de Corto Maltese ou aos ambientes (e cores) dos Escorpiões do Deserto. Hugo, nascido em 1927 em Rimini perto de San Marino e não muito distante de Veneza, é um jovem apaixonado pela literatura, com uma imaginação extraordinária e uma grande curiosidade que, como sabemos era um apaixonado por Veneza, mas se estabeleceu como um viajante por (e autor de) vários continentes e diversos países.
A leitura, como já referi, foi informativa, muito agradável, os nossos olhos perdem-se no calor que emana das aguarelas de Mauro de Luca, sendo que, pela minha parte, assim que acabei a leitura fiquei com a sensação de pouco (que explica a utilização do razoavelmente, dois parágrafos acima). Falta muita história, queremos saber um pouco mais, achamos o livro demasiado curto (apesar de ter mais de 128 páginas), tal é a estatura do homem que em 1967 criou a mítica Balada do Mar Salgado.
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