sexta-feira, 4 de março de 2022

A opinião de Miguel Cruz sobre: “Les Portugais”, de Olivier Afonso (texto) e Chico (desenho)

 


“Les Portugais” de Olivier Afonso (texto), um Lusodescendente nascido em Paris no primeiro ano após a revolução dos cravos, e de Chico (Aurélien Ottenwaelter) no desenho, é, como o nome indica, a história de dois... três… enfim, de vários Portugueses que emigraram para França ainda durante o período do Estado Novo e que, muitas vezes tratados miseravelmente, se dedicaram à construção civil na zona de Paris. 

Trata-se na sua base, da história dos pais do autor do texto. Concentramo-nos por isso num pequeno número de personagens que acompanhamos ao longo das cerca de 130 páginas, sem perder de vista toda a caracterização social da época, desde as redes de migração ao aproveitamento da situação de total desamparo de muitos dos migrantes, às suas condições de trabalho e de habitação, e aos termos de exploração de mão de obra barata, havendo ainda uma muito ligeira abordagem à incapacidade do governo francês em lidar com a integração destes e de outros grupos de emigrantes.

Toda a BD tem um ritmo fluído, a combinação texto-imagem é bem construída para que o leitor possa perceber todo o enquadramento da situação sem descrições exaustivas ou excesso de “balões”. O desenho intervala entre páginas de quadrados tradicionalmente separados, e (menos frequentes) páginas sem traços de separação, e mais claras e leves, que permitem um ritmo de diálogo entre duas ou três personagens em contexto de trabalho de obra de construção civil.

O estilo de desenho não é dos meus habitualmente preferidos, pouco detalhado ou estruturado, traço rápido e sem grandes detalhes, privilegiando expressões, ambiente e movimento, de que são exemplos as imagens das festas/celebrações de final de dia dos portugueses, com vinho verde, mas funciona muito bem para aquilo que é essencial: um documentário sobre a vida em “bairros de lata” com uma história principal de amizade e várias outras que se vão forjando, e uma história curiosa de amor que, verdadeiramente, deu origem a este livro.

Recomendo a leitura, pelo interesse humano da história, pelo retrato de um período da nossa história e pela imagem clara que passa da forma como os emigrantes portugueses eram vistos na França. Eu gostei de ler, admitindo que o olhar de leitor será distinto consoante a sua geração - lembro-me da primeira vez que fui a Paris com os meus pais e em criança, ter ficado em casa de um casal de emigrantes portugueses, ambos com trabalhos que se tornaram “estereótipos” de certa emigração portuguesa das décadas de 60 e 70. Les Portugais - les arènes (arenes.fr)






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