segunda-feira, 18 de abril de 2022

As opiniões de Miguel Cruz sobre: "Un Général, Des Generaux", de Boucq e Junker e "Sous les Galets, la Plage", de Pascal Rabaté

Aqui ficam mais duas opiniões de livros por Miguel Cruz publicadas no mercado francófono.

 


                                                            

Un Général, Des Generaux

Com "Um General, Vários Generais", Boucq e Junker devem-se ter divertido e gozado à grande. No caso de François Boucq, é visível o prazer caricatural que o moveu na realização desta BD. A qualidade do desenho, como é norma com este grande autor, é excecional, incute uma lisibilidade ao trabalho, mas ao mesmo tempo uma grandiosidade de tratamento gráfico que, só por si, permite um prazer de leitura enorme. Sim, confesso, se Boucq desenha um álbum, o mais provável é que o compre. A história? Depois se vê… Não acontece em relação a muitos autores.

Neste caso, esta BD trata dos acontecimentos associados à revolta na Argélia que conduziu à “sublevação/revolta” que levou o General de Gaulle ao poder em 1958, com Pierre Pflimlin a ser presidente do conselho apenas por 15 dias por, aparentemente, ter intenção de negociar com o movimento independentista argelino.

Trata-se de um tema que naturalmente não dirá muito aos leitores portugueses, porquanto se trate de um episódio isolado da história da França, com muitos pormenores de organizações e movimentos sobre os quais não conhecemos os detalhes. No entanto, a leitura é fácil (só não é fácil pousar o livro antes de acabar), o desenho grandioso e caricatural de Boucq é muito adequado, as poses e movimentos são excecionalmente retratadas, e transmite alegria e humor (a tratar um assunto sério) na forma como a história é relatada. E garanto que a grande maioria das personagens retratada, os generais que entram por uma porta e os que saem por outra, num bailado ridículo e anárquico, pleno de mal-entendidos, não ficam muito favoravelmente retratados. 

Aliás, o tom é dado logo na primeira página, com o diálogo:

De Gaulle: “Então Massu? Continuamos tão idiotas como sempre?”

Massu: “Ah sim, sempre Gaullistas, meu General”

Após as cerca de 130 páginas de BD, o livro inclui um dossier histórico sobre o episódio retratado, que permite estabelecer a base factual do relato romanceado feito. Edição Le Lombard.



                                                                                        



Sous les Galets, la Plage

Pascal Rabaté é um autor que sempre me suscitou viva curiosidade, pela abordagem literária que imprime às suas BD, bem como pelas temáticas humanistas e preocupações evidentes de natureza social, já para não falar do recurso frequente à exploração das marcas psicológicas das personagens e das suas relações familiares. Recordo-me da viva impressão que me deixou a adaptação de Tolstoi – Ibicus, realizada no final do século passado.

No final de 2021, a uma já extensa obra, veio somar-se Sous les Galets, la Plage, (sob os seixos, a praia) um one shot que veio a ser nomeado para vários dos muitos prémios de Banda Desenhada francófona. Numa estação balneária francesa, a “época” de 1962 acabou, sendo a parte inicial da história centrada em três jovens que as famílias deixam sozinhos nas suas casas de verão, pois brevemente os três darão início às suas carreiras universitárias distintas.
Numa noite em que estão os três sozinhos na praia (para a qual se desce por uma escada, vindo de um paredão sobre o qual estão, entre outras, as casas dos pais dos nossos jovens) a beber e a conversar, surge-lhes uma jovem (Odette) que lhes causa viva impressão, não apenas pela beleza, mas principalmente pelo comportamento, verdadeira promessa de liberdade e de emoções de fim de “festa”. 
E é Odette que vai, efetivamente, causar uma mudança de vida e viva emoção a dois dos jovens, verdadeiramente “entalados” com uma fotografia comprometedora e o seu envolvimento em ações ilegais, e criar uma forte “revolta” ao terceiro jovem, Albert, prometido a uma carreira militar como o seu pai.

Apesar de algum simplismo na forma como são tratadas algumas personagens e as suas motivações, é uma história de paixão e revolta, com um forte dramatismo final, de confrontação geracional, muito em linha com o que se pode observar em muito cinema francês da década de 60 e de 70.
O desenho é elegante, cru, sóbrio e adequado ao período, facilitando a leitura tanto do texto como dos silêncios. Edição de Rue de Sevres.

Sem comentários:

Enviar um comentário